Notícia
A Ciclo Cairu, uma das maiores indústrias de Rondônia, enfrenta um futuro incerto com a reforma tributária. Mesmo com raízes profundas no estado, a empresa já está abrindo uma unidade em Manaus e, diante das mudanças fiscais, pode ser forçada a migrar para a Zona Franca. Essa possível saída representaria um grande impacto econômico para Rondônia, com perda de empregos e arrecadação, afetando diretamente Pimenta Bueno e todo o estado. Apesar da paixão dos sócios por Rondônia, a nova realidade tributária pode tornar inviável a permanência da empresa no estado.
A Reforma Tributária aprovada no Brasil pela Emenda Constitucional nº 32/2023 tem como um de seus principais objetivos a simplificação do sistema tributário, eliminando incentivos regionais e, com isso, propondo encerrar a chamada "guerra fiscal" entre os Estados. No entanto, essa mudança estrutural pode gerar impactos desastrosos para os Estados da Região Norte, especialmente Rondônia, que, sem os incentivos fiscais, enfrentará graves dificuldades para manter sua competitividade econômica no cenário nacional.
1. A IMPORTÂNCIA DA EXTRAFISCALIDADE PARA O NORTE
O princípio da extrafiscalidade tem sido o grande motor do desenvolvimento da Amazônia Ocidental, diferentemente de outras regiões do país, que conseguiram crescer com base em outros fatores, como infraestrutura, acesso ao mar e industrialização. Desde 1912 , após a crise da borracha, ficou evidente que o Norte precisava de mecanismos especiais de estímulo econômico para se desenvolver, mecanismo este que foi inaugurado pela Constituição de 1946 ao prever que parte das Receitas auferidas pela União seriam dedicadas à valorização econômica da Amazônia.
A estratégia adotada pelo governo federal ao longo das décadas não foi arrecadar mais impostos, mas sim abrir mão da tributação para atrair investimentos e incentivar o desenvolvimento econômico da região. Isso gerou um conjunto de políticas tributárias diferenciadas, incluindo:
- Zona Franca de Manaus (Decreto-lei nº 288/1967 e Lei nº 8.387/1991) - gerou desenvolvimento, mas concentrado na capital do Amazonas.
- Áreas de Livre Comércio (Diversas leis ordinárias) - criadas para fomentar o crescimento em cidades estratégicas na fronteira brasileira.
- Convênio 100/1997 (CONFAZ) e Portaria 300/1996 (Decreto-lei nº 356/1968) - permitiram desoneração de ICMS e II e IPI, respectivamente, para produtos agropecuários e industriais.
- Incentivos à industrialização regional (Decreto-lei nº 1.435/1975; Decreto-lei nº 356/1968) - voltados para setores que utilizam matéria-prima da floresta.
Mesmo com esses incentivos, a Amazônia Ocidental representa menos de 4% da população brasileira e ainda sofre com dificuldades estruturais severas, incluindo problemas logísticos, ausência de rodovias adequadas, custo elevado de insumos e acesso limitado ao mercado consumidor.
2. RONDÔNIA: A PECULIARIDADE DE UM ESTADO PRODUTIVO
Dentre os Estados do Norte, Rondônia se destaca como um dos mais produtivos, principalmente devido à sua forte base agropecuária e ao setor de serviços que vem crescendo nos últimos anos. No entanto, esse desenvolvimento só foi possível devido a políticas de incentivos fiscais, que ajudaram a atrair investimentos e a compensar as dificuldades logísticas da região.
Diferentemente do Nordeste, que possui portos marítimos e facilidade de escoamento, a Amazônia Ocidental enfrenta obstáculos significativos para competir em igualdade de condições com os demais Estados. Rondônia, especificamente, sofre com o alto custo de transporte, devido à sua localização e à precariedade das vias de escoamento. O preço dos insumos básicos para a produção industrial e agropecuária é muito maior em relação ao restante do país.
Sem os incentivos fiscais, Rondônia será colocada para competir diretamente com Estados do Sul e Sudeste, que possuem infraestrutura consolidada, acesso a mercados consumidores e menores custos operacionais. A eliminação desses incentivos equivale a retirar as muletas de um corredor que ainda está aprendendo a andar, forçando-o a competir em uma maratona contra atletas já treinados.
3. IMPACTO DA REFORMA TRIBUTÁRIA PARA RONDÔNIA
A proposta da Reforma Tributária prevê a unificação de tributos, eliminando todos os incentivos fiscais regionais do estado (exceto para Guajará-Mirim que é uma Área de Livre Comércio) criando um sistema tributário menos complexo. Mas, na prática, isso significa que Rondônia perderá todos os instrumentos que garantiam sua competitividade, gerando impactos significativos, tais como:
3.1. Aumento do Custo de Produção
- A eliminação dos incentivos ao setor agropecuário e industrial elevará o custo da produção, tornando Rondônia menos competitiva em relação a outros Estados.
- Os produtos produzidos no Estado ficarão mais caros, reduzindo sua participação no mercado nacional.
3.2. Êxodo de Empresas e Desindustrialização
- Empresas que atualmente operam em Rondônia devido aos incentivos fiscais podem migrar para outras regiões do país, onde a infraestrutura é melhor e os custos logísticos são menores.
- A desindustrialização pode ocorrer rapidamente, pois sem incentivos fiscais não haverá condições para a manutenção dos atuais empreendimentos e nem para atrair novos investidores.
3.3. Redução na Arrecadação e No Desenvolvimento Regional
- A Reforma Tributária altera o princípio de arrecadação da origem (de onde se fatura a nota fiscal) para o destino (para onde se consome o produto). Logo, como Rondônia não é um mercado consumidor, mas um polo produtor, o impacto na arrecadação será sentido imediatamente;
- Somado aos prejuízos ao erário pela alteração do método de arrecadação, a retirada dos incentivos resultará na queda na arrecadação estadual e municipal por outras vias também, pois sem ter como competir com as empresas produtoras de similares de outros estados, as empresas que atualmente estão implantadas, que contribuem e geram empregos em Rondônia, tendem a deixar o o Estado.
- A diminuição dos empregos formais, pelo arrefecimento da dinâmica econômica e social, impactará diretamente a economia local, aumentando a dependência de programas assistenciais.
3.4. Desigualdade Regional Acentuada
- Enquanto a Reforma Tributária se propõe a criar um sistema mais uniforme, na prática, ela ignora as diferenças regionais.
- Estados mais desenvolvidos não precisam de incentivos fiscais para atrair investimentos, mas Rondônia e outros Estados do Norte sim.
- Sem incentivos, a desigualdade entre Norte e Sul/Sudeste será aprofundada, consolidando um cenário de concentração de riqueza nas regiões mais ricas.
4. UMA REGIÃO SEM COMPETITIVIDADE NO CENÁRIO NACIONAL
Ao retirar os benefícios fiscais de Rondônia e colocá-lo para competir sem nenhuma compensação contra Estados como São Paulo, Paraná, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, o governo estará essencialmente decretando o sufocamento econômico do Estado.
A analogia com o Esporte Clube de Ji- Paraná disputando a Série A do Campeonato Brasileiro é perfeita. Rondônia não tem estrutura para competir de igual para igual com Estados que possuem portos, ferrovias, rodovias de alta qualidade, acesso facilitado ao mercado internacional e menores custos logísticos.
Se a Reforma Tributária for implementada sem ajustes que garantam tratamento diferenciado para a Região Norte, o futuro econômico de Rondônia será comprometido, resultando em perda de investimentos, aumento do desemprego e desaceleração do crescimento do Estado.