Notícia
Jair Bolsonaro se gabava, dias atrás, por ter montado “uma equipe de ministros nunca sonhada em nossa nação”.
Nas casas das melhores famílias, todo mundo conhece ao menos uma dúzia de secundaristas que fariam melhor, e com menos barulho, do que o ministro da Educação. Ou do Meio Ambiente.
Mas especificamente no caso do Ministério da Saúde, nem o opositor mais ferrenho do governo evitou levantar as mãos para o céu quando surgiram as primeiras notícias da pandemia e viu que no posto estava um médico e ex-secretário municipal da Saúde, e não um tuiteiro capaz de levar uma família inteira para o buraco por pura incapacidade gramatical.
Em vez de vir a público capitalizar a escolha, o presidente se retorce de ciúmes.
Na semana passada, Bolsonaro dava sinais cada vez mais claros de descontentamento com Lui Henrique Mandetta. Admitiu que não se bicava com o responsável pela gestão da crise, disse faltar humildade ao subordinado e deu a entender que só não o demitia porque estávamos no meio da guerra. Na linguagem bélica, o comandante em-chefe salvou a pele do soldado implodindo o moral das tropas.
No domingo, a ciumeira ficou ainda mais escancarada.
Sem citar nomes, afirmou que integrantes de seu governo “viraram estrelas” e que a hora deles iria chegar, podendo usar a caneta superpoderosa a qualquer momento. Procurador, Mandetta deu de ombros: estava dormindo, mas prometeu conferir a declaração no dia seguinte.
Bolsonaro amanheceu na segunda-feira desmoralizado.
A artilharia verbal reforça o caráter inusual, para não dizer outra coisa, do atual governo, um Frankenstein que tenta amarrar no mesmo barco o apoio incondicional de lavajatistas, militares, empresários sedentos por desregulamentação e o chamado núcleo ideológico que paga pedágio a Olavo de Carvalho.
Em condições normais, a pergunta seria por que o presidente alvejaria o próprio barco no meio da tempestade. Mas estes não são tempos normais.
Com ou sem esses grupos, Bolsonaro já reúne o próprio time, que aqui pode ser nomeado como bolsonarismo-raiz, aqueles que apoiarão o presidente com ou sem Sergio Moro, com ou sem Paulo Guedes, com ou sem Mandetta. Mesmo que o capitão determine um salto coletivo no penhasco para combater a pandemia.
Enquanto atacava seus subordinados abaixo da linha da cintura, em Brasília, era possível ouvir as vozes de seus apoiadores dizendo “amém”.
Alguém ainda precisa explicar os perigos de ter diante de um desafio histórico um presidente em busca da obediência incondicional e uma turma que acena bovinamente a tudo o que diz?